Com Krishnamurti (Krishnamurti Foundation of India)



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#7421






Meditando

com Krishnamurti

(Krishnamurti Foundation of India)

A todos os interessados,

Em 1990 trouxe da Índia um livro publicado pela KFI (Krishnamurti Foundation of India), sob o título "Meditations". É uma compilação de textos de Krishnamurti, que tratam do tema da meditação, extraídos de 11 diferentes obras suas. Variam de tamanho, desde uma simples linha até uma página inteira. Para quem está envolvido de algum modo com a prática da meditação, trata-se de abordagens fundamentais para uma reflexão mais profunda e que poderia embasar melhor futuras discussões sobre o tema.

O livro foi publicado pela primeira vez em 1980, na Índia, e traz em seu prefácio as palavras do próprio K que, dessa forma, endossa os seus colaboradores nessa tarefa. Suas palavras:


PREFÁCIO
“O homem, a fim de escapar de seus conflitos, inventou muitas formas de meditação. Estas, baseadas no desejo, na vontade e no ímpeto para alcançar, implicam em conflito e numa luta para conseguir. Esse esforço consciente e deliberado está dentro dos limites de uma mente condicionada e nele não há liberdade. Todo esforço para meditar é a negação da meditação”.

“Meditação é o fim do pensamento. Só então há uma dimensão diferente que está além do tempo”.


J. Krishnamurti

Março de 1979


Muita paz!
F.Guedes, Om

Belo Horizonte, 04/01/02

Uma mente meditativa é silenciosa. Não o silêncio que o pensamento pode conceber; não o silêncio de um anoitecer tranqüilo; mas o silêncio em que o pensamento - com todas as suas imagens, palavras e percepções - cessou completamente. Essa mente meditativa é a mente religiosa - de uma religião que não afetada pela igreja, templos ou cânticos.

A mente religiosa é a explosão do amor, amor esse que não conhece separação. Para ele, longe é perto. Não o um e o múltiplo; mas, ao invés disso, aquele estado de amor em que toda divisão cessou. Como a beleza, não pode ser medido por palavras. É só a partir desse silêncio que a mente meditativa age.


* * *
A meditação é uma das maiores artes da vida - talvez a maior - e, possivelmente, não podemos aprendê-la de ninguém. Essa é a sua beleza. Não tem técnica e, portanto, não tem autoridade. Quando você aprende a seu próprio respeito, observando-se, observando como anda, como come, o que diz, a intriga, o ódio, o ciúme - se está atento a tudo isso em você, sem qualquer escolha - então, isto é parte da

meditação. Portanto, a meditação pode ter lugar quando se está sentado num ônibus, caminhando num Bosque repleto de luz e sombra, ouvindo o canto dos pássaros ou contemplando o rosto de sua mulher ou de seu filho.


* * *
É curioso quão importante a meditação se torna; não tem princípio nem fim. É como uma gota de chuva: naquela gota estão contidos todos os riachos, grandes rios, mares e quedas d'água; aquela gota nutre a terra e o homem; sem ela, a terra seria um deserto. Sem a meditação, o coração se torna um deserto, uma terra devastada.
* * *
Meditação é descobrir se o cérebro, com todas as suas atividades e experiências, pode ficar absolutamente quieto. Não forçado, pois, no momento em que você o força, há dualidade. A entidade que

diz, "Gostaria de experiências maravilhosas; por isso, preciso forçar o meu cérebro a se aquietar", jamais o fará. Mas, se você começa a investigar, observar e prestar atenção a todos os movimentos do pensamento, seus condicionamentos, desígnios, medos e prazeres, a observar como o cérebro funciona, então verá que o cérebro se torna extraordinariamente quieto; essa quietude não é sono, mas tremenda atividade que é, por si mesma, tranqüila. Um grande dínamo, que funciona perfeitamente, dificilmente faz barulho; só quando há atrito, há ruído.


* * *
Silêncio e amplidão andam juntos. Imensidão do silêncio é imensidão da mente em que já não existe um centro.
* * *
Meditação é trabalho árduo. Exige a mais alta forma de disciplina - que não é conformação, imitação ou obediência - mas disciplina que vem da constante atenção, não só para as coisas externas à sua volta, mas também as internas. Portanto, a meditação não é uma atividade de isolamento, mas ação na vida diária que exige cooperação, sensibilidade e inteligência. Sem lançar as bases de uma vida correta, a meditação se torna uma fuga e, portanto, sem valor. Uma vida correta não é seguir a moralidade social, mas libertar-se da inveja, da cobiça e da busca de poder - todas gerando inimizade. A libertação dessas coisas não vem pelo exercício da vontade, mas tomando consciência delas pelo autoconhecimento. Sem o conhecimento das atividades do eu, a meditação se torna estimulação dos sentidos e, portanto, de muito pouco significado.
* * *
Estar procurando experiências mais amplas, profundas e transcendentais é uma forma de fuga da verdadeira realidade, "o que é" e que é nós mesmos, a nossa mente condicionada. Por que uma mente atenta, inteligente e livre deveria ter qualquer "experiência"? Luz é luz; não procura mais luz.
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A meditação é uma das coisas mais extraordinárias e, se não souber de que se trata, você será como um cego num mundo de cores brilhantes, sombras e luzes cambiantes. Não é uma questão intelectual, pois quando o coração penetra a mente, esta passa a ter uma qualidade diferente; ela é , então, realmente ilimitada, não só em sua capacidade de pensar e agir com eficiência, mas também no sentido de

viver num amplo espaço em que você faz parte de tudo. Meditação é o movimento do amor. Não o amor do um ou do múltiplo. É como água que qualquer um pode beber de um cântaro; seja o cântaro de ouro ou de barro, a água é inexaurível. E coisa peculiar acontece que nem a droga nem a auto-hipnose podem produzir: é como se a mente entrasse dentro de si mesma, começando na superfície e penetrando cada vez mais fundo, até que profundidade e altura tenham perdido o seu significado e toda forma de medida tenha cessado. Nesse estado há completa paz - não satisfação que vem da gratificação - mas uma paz que tem ordem, beleza e intensidade. Toda ela pode ser destruída, como uma flor pode ser destruída; e, contudo, por causa de sua própria vulnerabilidade, torna-se indestrutível. Essa meditação não se aprende com outrem. Deve-se começar sem nada saber a seu respeito e prosseguir com simplicidade. O solo em que a mente meditativa pode surgir é a vida diária, a disputa, a dor e a alegria fugaz. Deve surgir lá, trazendo ordem e daí prosseguir sem parar. Mas se você está preocupado só em produzir ordem, então essa mesma ordem produzirá sua própria limitação e a mente tornar-se-á sua prisioneira. Em todo esse movimento, você deve começar de algum modo pelo outro extremo, da outra margem, e não ficar preocupado com essa margem ou em como cruzar o rio. Caia n'água sem saber nadar. A beleza da meditação está em você não saber onde se encontra, para onde se dirige e qual é o fim.


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Meditação não é algo diferente da vida diária, não é recolher-se a um canto e meditar por dez minutos e depois encerrá-la e tornar-se um carniceiro - metafórica ou realmente. Meditação é uma das coisas mais sérias. Pode ser praticada durante todo o dia, no escritório, com a família, quando se diz a alguém, "Eu te amo", ou quando se está pensando nos filhos. Mas eis que eles são educados por você para serem soldados, para matar, para serem patriotas, para adorar a bandeira, educando-os para cair nas armadilhas do mundo moderno.

Observar e perceber sua participação em tudo isso, faz parte da meditação. E quando assim meditar, você descobrirá uma beleza extraordinária; agirá corretamente a cada momento; e se não agir corretamente num dado momento, não faz mal: você retomará o reto agir, sem perder tempo com arrependimentos.

Meditação é parte da vida, não algo diferente dela.
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Se você se lança à meditação, não haverá meditação. Se você se dispõe a ser bom, a bondade jamais florescerá. Se você cultivar a humildade, ela deixará de existir. Meditação é a brisa que entra quando a janela está aberta; mas se você a mantiver aberta, convidando-a deliberadamente a entrar, ela jamais aparecerá.
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Meditação não é um meio para um fim. É ambos, meio e fim.
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Que coisa extraordinária é a meditação! Se houver qualquer tipo de compulsão e esforço para imitar, para ajustar o pensamento, então torna-se um fardo desgastante. O silêncio desejado deixa de iluminar; se se trata de procura de visões e experiências, então conduz a ilusões e auto-hipnose. É só com o florescer do pensamento e, por conseguinte, com o seu fim, que a meditação adquire significado; o pensamento só pode florescer em liberdade, não nos padrões cada vez mais amplos do conhecimento. O conhecimento pode propiciar as mais novas experiências, de maior sensação, mas a mente que busca experiências de qualquer tipo é imatura. Maturidade é libertação de toda a experiência; não se acha mais sob qualquer influência para ser ou não ser.

A maturidade na meditação é a libertação da mente do conhecimento, pois ele molda e controla toda a experiência. A mente que é uma luz para si mesma não precisa de experiência. A imaturidade é o desejo de maior e mais ampla experiência. Meditação é o vagar através do mundo do conhecimento, mas dele liberto para penetrar o desconhecido.


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Temos de descobrir por nós mesmos e não através de quem quer que seja. Tivemos a autoridade de professores, salvadores e mestres. Se quiser descobrir realmente o que é meditação, você tem de deixar de lado, completamente, toda e qualquer autoridade.
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Felicidade e prazer podem ser comprados em qualquer mercado por um preço. Mas Bem-aventurança, não - para você ou para qualquer outro. Felicidade e prazer estão comprometidos com o tempo. Só em total liberdade existe Bem-aventurança. Prazer, como felicidade, pode ser buscado e encontrado, de muitas maneiras. Mas eles vêm e se vão. Bem-aventurança - esse estranho senso de alegria - não tem motivo.

Possivelmente, não pode ser procurada. Uma vez ocorrida e, dependendo da qualidade de sua mente, permanece - sem fim e sem causa, algo não mensurável pelo tempo. Meditação não é busca de prazer ou felicidade.

Ao contrário, é um estado da mente em que não existe conceito ou fórmula, e existe, portanto, liberdade total. É só a uma tal mente que ocorre essa Bem-aventurança - que não foi procurada e nem convidada. Uma vez ocorrida, ainda que possa estar vivendo no mundo - com seus barulhos, prazeres e brutalidade - a mente não será afetada.

Uma vez ocorrida, cessam os conflitos. Mas o fim do conflito não é, necessariamente, a total liberdade. Meditação é o movimento da mente nessa liberdade. Nesta explosão de alegria, os olhos tornam-se inocentes, e o amor torna-se então bênção.


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Não sei se já notaram que quando você presta toda a atenção, há completo silêncio. E, nessa atenção, não existem fronteiras, nenhum centro, nenhum "eu" para estar consciente ou atento. Essa atenção, esse silêncio, é um estado de meditação.
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Dificilmente prestamos atenção ao som de um cachorro latindo, uma criança chorando ou à risada de alguém que passa. Nós nos separamos de tudo e, uma vez separados, olhamos e ouvimos tudo o mais. É essa separação que é tão destrutiva, pois nela reside todo conflito e confusão. Se prestasse atenção ao som daqueles sinos, em completo silêncio, você viajaria nele - ou melhor, o som o levaria através de vales e montanhas. Sua beleza só pode ser sentida quando você e o som não estão separados, quando se é parte dele. Meditação é o fim da separação, não empreendida por qualquer ação, vontade ou desejo.

Meditação não é uma coisa separada da vida; é-lhe a própria essência, a própria essência da vida diária. Ouça aqueles sinos, a risada do camponês que passa com a esposa, o som da campainha da bicicleta da garota passando: é toda a vida, e não apenas um pedaço dela, que a meditação revela.


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Meditação é ver o que é e ir-lhe além.
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Percepção sem palavras, isto é, sem pensamento, é um dos fenômenos mais estranhos. É quando a percepção é muito mais aguda, não apenas com o cérebro, mas com todos os sentidos. Tal percepção não é fragmentária como a do intelecto e nem uma questão de emoções. Pode ser chamada de percepção total e faz parte da meditação. Percepção sem percebedor é, na meditação, comungar com a altura e a profundidade do que é imenso. Essa percepção é inteiramente diferente de ver um objeto sem um observador, porque na percepção da meditação não há objeto; nem experiência, portanto. A meditação pode, contudo, ter lugar quando estamos de olhos abertos e cercados de objetos de todo o tipo. Mas, então, tais objetos não têm valor algum. Nós os vemos, mas não há processo de reconhecimento, o que significa que não há o experienciar.

Qual o significado de tal meditação? Não há significado, nem utilidade. Mas nessa meditação há um movimento de grande êxtase que não pode ser confundido com prazer. É o êxtase que dá aos olhos, ao

cérebro e ao coração a qualidade da simplicidade. Se não vermos a vida como algo totalmente novo, ela e tornará rotineira, aborrecida e fútil. Por isso a meditação é da maior importância. Ela abre as portas ao incalculável, ao imensurável.
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A meditação nunca é do tempo; o tempo não pode produzir mutação; pode produzir mudanças que exigem novas mudanças, como toda reforma. A meditação que deriva do tempo sempre compromete, nunca é livre, e sem liberdade continuará a haver escolha e conflito.
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Temos de alterar a estrutura de nossa sociedade, sua injustiça, sua aterradora moralidade, as divisões que cria entre o homem e o homem, suas guerras, a absoluta falta de afeição e amor que está destruindo o mundo. Se sua meditação é tão somente uma questão pessoal, que você desfruta pessoalmente, então não se trata de meditação. Meditação implica numa mudança radical e completa da mente e do coração. Isto só se torna possível quando existe esse extraordinário silêncio interior e somente isso produz a mente religiosa. Essa mente sabe o que é sagrado.
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Beleza significa sensibilidade - um corpo sensível - o que quer dizer dieta correta, modo de vida correto. A mente, então, sem saber, tornar-se-á inevitável e naturalmente quieta. Você não pode aquietar a mente porque você mesmo é o trapalhão - perturbado, ansioso e confuso. Como pode aquietar a mente? Mas quando entender o que é a quietude, a confusão, o sofrimento e o fim do sofrimento, quando entender o prazer, então, de tudo isso surgirá uma mente extraordinariamente calma; você não tem de procurá-la. Deve começar do começo e o primeiro passo é também o último. E isso é meditação.
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Meditar é não se importar com o tempo.
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Meditação não é uma fuga do mundo; não é uma atividade isolante, fechada em si; mas, ao contrário, compreensão do mundo e de seus caminhos. O mundo tem pouco a oferecer além de comida, roupa, abrigo e prazer com sua contrapartida, o sofrimento.

Meditação é afastamento desse mundo; temos de vê-lo de fora, por inteiro. Assim, o mundo adquire um significado e a beleza dos céus e da terra torna-se constante. Então, o amor não é prazer. E disto vem toda a ação que não é resultado da tensão, da contradição, da busca de auto-satisfação ou idéia de poder.


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Se você assume uma atitude deliberada, uma postura a fim de meditar, então isso se torna um jogo, uma brincadeira da mente. Se você decide desembaraçar-se da confusão e infelicidade da vida, então isso se torna um exercício de imaginação... e isso não é meditação. A mente, consciente ou inconsciente, não pode tomar parte nisso; não deve nem mesmo estar consciente da extensão e beleza da meditação - e, se estiver, melhor seria sair e comprar um romance para ler.

Na plena atenção da meditação não há conhecimento, reconhecimento e nem lembrança de algo acontecido. O tempo e o pensamento cessaram completamente, pois são o centro limitador de sua própria visão.

No momento de luz, o pensamento fenece. O esforço consciente para experienciar e recordar torna-se a palavra do que já se foi. E a palavra nunca é a coisa real. Nesse momento, que não é do tempo, o que resta é o imediato; mas o que resta não possui símbolo, não pertence a ninguém, a nenhum deus.
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Meditação é descobrir se não existe um campo ainda não contaminado pelo conhecido.
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Meditação é o florescer da compreensão. A compreensão não se acha dentro das fronteiras do tempo; o tempo nunca traz a compreensão. A compreensão não é um processo gradual a ser formado pouco a pouco, cuidadosa e pacientemente. A compreensão se dá agora ou nunca; é um clarão que destrui e não uma diversão; é esse estilhaçar que tememos e evitamos, consciente ou inconscientemente. A compreensão pode mudar o curso de nossa vida, a maneira de pensar e agir, pode ser agradável ou não, mas é certamente um perigo para toda a relação. Mas, sem a compreensão, o sofrimento continua. O sofrimento só acaba através do autoconhecimento, da atenção a cada pensamento e sentimento, a cada movimento do consciente e do que se oculta. Meditação é compreensão do que é consciente, oculto e aberto, e do movimento que jaz além de todo pensamento e sentimento.

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Era uma dessas manhãs adoráveis nunca antes vista. O sol surgia e podia-se vê-lo entre o eucalipto e o pinheiro. Pairava sobre as águas dourado e brilhante, com uma luz que só existe entre as montanhas e o mar. Era uma manhã clara que deixa nossa respiração em suspenso, cheia daquela luz estranha que não se vê apenas com os olhos, mas com o coração. E, ao vê-la, os céus se aproximam da terra e nos perdemos na beleza. Sabe, não se deve meditar em público, ou com outrem, ou em grupo: deve-se meditar a sós, na quietude da noite ou no silêncio da manhã bem cedo. Quando meditar a sós, deverá haver solidão. Deve-se estar completamente a sós, sem seguir um sistema, método ou palavras repetitivas, sem perseguir pensamentos ou moldá-los de acordo com os seus desejos.



Esta solidão vem quando a mente se liberta dos pensamentos. Havendo influência do desejo ou das coisas que a mente persegue no futuro ou no passado, não há solidão. Essa solidão só vem na imensidão do presente. Aí então, na quietude do recolhimento em que cessa toda comunicação, em que não há o observador com suas ansiedades, com seus tolos apetites e problemas - só então, na quietude da solidão, a meditação torna-se algo que não pode ser colocado em palavras. A meditação é então um eterno movimento.

Não sei se já meditaram antes, se já estiveram a sós, por si mesmos, afastados de todas as coisas, de toda pessoa, de todo pensamento e busca, se já estiveram completamente sozinhos - não isolados ou refugiados em algum sonho fantasioso ou visão - mas afastados, de modo a não haver coisa alguma reconhecível em vocês, nada que se possa tocar com o pensamento ou sentimento, tão afastados que nessa

total solidão o próprio silêncio se torna a única flor, a única luz, aquela qualidade eterna que não pode ser medida pelo pensamento.

Somente em tal meditação o amor tem seu ser. Não se dê ao trabalho de tentar exprimi-lo: ele se exprimirá por si. Não o utilize. Não tente pô-lo em ação: ele agirá e, ao agir não haverá arrependimento ou contradição, nenhuma infelicidade ou labuta própria do homem.

Portanto, meditem a sós. Percam-se. E não tentem lembrar por onde andaram. Se tentarem lembrar, então será algo morto. E se se apegarem à sua lembrança, então, nunca mais estarão de novo a sós. Portanto, meditem na solidão sem fim, na beleza desse amor, nessa inocência, no novo - então terá lugar a bem-aventurança que não se acaba.

O céu estava muito azul, daquele azul que vem depois da chuva, daquelas chuvas que vêm depois de muitos meses de seca. Depois da chuva os céus estavam límpidos, os montes regozijantes e a terra silenciosa. Cada folha tinha sobre si a luz do sol e sentia-se a terra bem próxima. Portanto, meditem no mais secreto recesso de seu coração e de sua mente, onde nunca estiveram antes.


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Meditação não é um meio para um fim; não existe um fim, uma chegada; é um movimento no tempo e fora do tempo. Todo sistema, todo método, vincula o pensamento ao tempo; mas a atenção sem escolha a todo pensamento e sentimento, compreendendo-lhes os motivos e o mecanismo, o que lhes permite florescer, é o começo da meditação. A meditação é um movimento que transcende o tempo, quando o pensamento e sentimento florescem e morrem. Nesse movimento há êxtase; no vazio total existe amor; e quando há amor, há destruição e criação.
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Meditação é aquela luz na mente que ilumina o caminho para a ação e, sem essa luz, não há amor.
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Meditação nunca é oração. Oração, súplica, nasce da autopiedade. Você reza quando se acha em dificuldade, quando existe sofrimento; mas quando está feliz, alegre, não há súplica. Essa autopiedade, tão enraizada no homem, é a origem da separação. Aquilo que é, ou se pensa separado, sempre procurando identificação com algo não separado, só traz mais divisão e dor. É a partir dessa confusão que clamamos aos céus, ao nosso marido ou a alguma deidade criada pela mente. Esse clamor pode encontrar uma resposta, o eco da autopiedade, em sua separação.

A repetição de palavras, de orações, é auto-hipnótica, auto-enclausurante e destrutiva. O isolamento do pensamento sempre está dentro do campo do conhecido e a resposta à oração vem do conhecido.

A meditação está longe disso. Nesse campo o pensamento não pode entrar; não há separação e, portanto, nenhuma identidade. Meditação é a céu aberto; nela não segredo. Tudo está exposto, claro; só então ocorre a beleza do amor.
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Nessa manhã, a qualidade da meditação era o nada, totalmente desprovida se achava de tempo e espaço; um fato e não uma idéia ou paradoxo de especulações opostas. Encontramos esse estranho vazio quando a raiz de todos os problemas se desfaz. Essa raiz é o pensamento, pensamento que divide e retém. Na meditação a mente se esvazia de fato do passado, embora possa usá-lo como pensamento. Isto prossegue pelo dia afora e à noite o sono é o esvaziar-se do dia que passou, e assim a mente toca aquilo que não é do tempo.
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Meditação não é mero controle do corpo e do pensamento, não é um sistema de inspiração e expiração. O corpo deve estar tranqüilo, saudável e sem tensões; a sensibilidade para sentir deve ser aguçada e mantida; e a mente, com todo seu tagarelar, perturbações e incertezas, deve chegar a um fim. Não é pelo organismo que devemos começar, mas pela mente com suas opiniões, preconceitos e interesse próprio. Quando a mente está saudável, vital e vigorosa, o sentimento crescerá e tornar-se-á xtremamente sensível. Então o corpo, com sua inteligência natural ainda não corrompida pelo hábito e pelo gosto, funcionará devidamente.

Portanto, devemos começar pela mente e não pelo corpo, a mente sendo pensamento com sua expressões variadas. A mera concentração torna estreito, limitado e frágil o pensamento, mas a concentração vem como uma coisa natural quando tomamos consciência dos caminhos do pensamento. Essa consciência não vem do pensador que escolhe e descarta, que se apega a alguma coisa ou a rejeita. Essa consciência não tem escolha e é, ao mesmo tempo, interior e exterior, uma interação entre os dois aspectos, de modo que a divisão entre ambos chega a um fim.

O pensamento destrói o sentimento - o sentimento sendo amor. O pensamento só pode oferecer prazer e, na busca do prazer, o amor é posto de lado. O prazer de comer, de beber, tem continuidade no pensamento, e só controlar ou suprimir esse prazer que o pensamento produziu não faz sentido; só cria formas diversas de conflito e compulsão.

O pensamento, que é matéria, não pode buscar o que está além do tempo, pois o pensamento é memória e a experiência nessa memória está morta como as folhas do outono passado.

Ao tomar consciência de tudo isso, vem a atenção, que não é produto da desatenção. A desatenção é que ditou os hábitos prazerosos do corpo e dissolveu a intensidade do sentimento. A desatenção não pode se transformar em atenção. A consciência da desatenção é atenção.

A visão de todo esse complexo processo é meditação e só a partir dela vem a ordem nessa confusão, ordem tão absoluta quanto a matemática, a partir da qual há ação - o fazer imediato. Ordem não é arranjo, plano e proporção: isso vem mais tarde. A ordem vem de uma mente não confundida pelas coisas do pensamento. Quando o pensamento silencia, lá está o vazio, que é ordem.


* * *
Era de fato um rio maravilhoso, largo e profundo, com tantas cidades a suas margens; tão despretensiosamente livre e, no entanto, nunca abandonado. Toda a vida lá estava a suas margens: campos verdes, florestas, casas isoladas, a morte, o amor e a destruição; havia pontes largas e compridas sobre ele, graciosas e úteis. Outros riachos e rios juntavam-se a ele, mas ele era a mãe de todos eles, grandes e pequenos. Sempre cheio, purificando-se; e, ao anoitecer, era uma bênção olhá-lo, sob nuvens de cores profundas e em suas águas douradas. Mas o pequeno fio d'água, tão longe entre aquelas gigantescas rochas, parecendo concentradas em produzi-lo, era o princípio da vida e o seu fim estava além de suas margens e dos mares.

A meditação era como esse rio, só que sem princípio nem fim; teve início, mas seu fim era também seu começo. Não tinha uma causa e seu movimento era sua renovação. Sempre nova, jamais acumulando para envelhecer; sem raízes no tempo, nunca é poluída. Para meditar, é bom não forçar ou fazer qualquer esforço, começando por um fio d’água e indo além do tempo e espaço, onde pensamento e sentimento não podem entrar e onde não há experiência.


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Meditação é a total liberação de energia.
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No espaço que o pensamento cria à sua volta não existe amor. Esse espaço divide o homem do homem e nele reside todo o vir-a-ser, a batalha da vida, a agonia e o medo. A meditação é o fim desse espaço, o fim do "eu". Então, a relação tem um significado bem diferente, pois, nesse novo espaço, que não é feito de pensamento, o outro não existe, porque você não existe.

Meditação, então, não é a procura de alguma visão, ainda que santificada pela tradição. Ao invés disso, é um espaço sem fim onde o pensamento não pode entrar. Para nós, o pequeno espaço feito pelo pensamento em torno de si, que é o "eu", é extremamente importante, pois isso é tudo o que a mente conhece, identificando-se com tudo nesse espaço. E o medo de não ser nasce nesse espaço. Mas em meditação, quando isso for compreendido, a mente poderá entrar numa dimensão do espaço em que ação é inação.

Não sabemos o que é o amor, pois no espaço criado pelo pensamento ao seu redor, chamado "eu", o amor torna-se conflito entre o "eu" e o "não-eu". Esse conflito, essa tortura, não é o amor.

O pensamento é a negação do amor e não pode entrar naquele espaço onde o "eu" não existe. Naquele espaço está a bênção que o homem procura e não pode encontrar. Ele a procura dentro das fronteiras do pensamento e o pensamento destrui-lhe o êxtase dessa bênção.


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A crença é tão desnecessária quanto o ideal. Ambos dissipam a energia para acompanhar o desenrolar do fato que acontece, "o que é". Crenças, como ideais, são fugas do fato e na fuga não há fim do sofrimento. O fim do sofrimento é a compreensão do fato, momento a momento. Não existe sistema ou método que nos dê compreensão; só uma consciência, sem escolha, de um fato o fará. A meditação de acordo com um sistema é evitar o fato daquilo que você é; é muito mais importante compreender a constante mudança dos fatos a seu próprio respeito do que meditar para achar Deus ou ter visões, sensações e outras formas de entretenimento.
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A meditação àquela hora era liberdade, era como entrar num mundo desconhecido de beleza e quietude, um mundo sem imagem, símbolo ou palavra, sem ondas da memória. O amor era a morte de cada minuto e cada morte, renovação do amor. Não se tratava de apego, pois não havia raízes; florescia sem uma causa e era uma chama que destruía pelo fogo todas as fronteiras, as cercas cuidadosamente construídas pela consciência. Era beleza, além do pensamento e do sentimento; não podia ser retratada numa tela, posta em palavras ou esculpida em mármore. Meditação era alegria e com ela vinha uma bênção.
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O florescer do amor é meditação.
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Na meditação temos de descobrir se existe um fim para o conhecimento e, portanto, libertação do conhecido.
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Choveu pesado noite e dia e, em sua passagem, a enxurrada precipitava-se rumo ao mar, tingindo-o de chocolate. Ao andar pela praia, as ondas faziam-se enormes, arrebentando-se com forças em magnífica curvatura. Ao caminhar contra o vento, sentia-se não haver nada entre você e o céu, numa celestial abertura. Estar completamente aberto, vulnerável - aos montes, ao mar e aos homens - é a própria essência da meditação.

Não ter resistência, quaisquer barreiras interiores, estar completa e realmente livre de todo impulso, compulsão e exigência de menor importância, é caminhar pela vida de braços abertos. Naquela tarde, ao caminhar sobre a areia molhada, com as gaivotas ao seu redor, sentia-se um extraordinário senso de ampla liberdade e a grandiosa beleza do amor, não dentro ou fora de você, mas por toda a parte.

Não percebemos quão importante é estar livre de incômodos prazeres com suas dores, de modo que a mente fique só. Somente a mente de todo só é aberta. Você sentia tudo isso de repente, como um vendaval varrendo a terra e você. E lá estava você - desprovido de tudo, vazio - e, no entanto, escancarado. Sua beleza não residia em palavras e sentimentos, mas parecia estar por toda a parte - ao seu

redor, dentro de você, sobre as águas e nos montes. Meditação é isso.


* * *
Meditação não é concentração, que é exclusão, separação, resistência e, portanto, conflito. Uma mente meditativa pode se concentrar, pois então não há exclusão, resistência; mas uma mente concentrada não pode meditar.
* * *
Na compreensão da meditação, há amor, que não é produto de sistemas, hábitos ou acompanhamento de um método. O amor não pode ser cultivado pelo pensamento. Talvez possa vir à existência no completo silêncio, silêncio no qual o meditador encontra-se inteiramente ausente; e a mente só pode silenciar quando compreende seu próprio movimento, como pensamento e sentimento. Para compreendê-lo, não pode haver condenação no observar. Observá-lo assim é disciplina, mas um tipo de disciplina fluida, livre, não a disciplina da conformidade.
* * *
Naquela manhã, o mar era como um lago ou um rio enorme, sem uma onda, e tão calmo que podia-se ver os reflexos das estrelas, ainda bem cedinho. A madrugada ainda não havia raiado, de modo que as estrelas, o reflexo dos penhascos e as luzes distantes da cidade refletiam-se sobre as águas. E quando o sol surgiu no horizonte sem nuvens, traçou uma rota dourada e era extraordinário ver a luz da Califórnia enchendo a terra e cada folha e talo de grama.

Ao observar, descia uma grande quietude sobre você. O próprio cérebro ficava muito quieto, sem qualquer reação ou movimento, e era estranho sentir essa imensa quietude. "Sentir" não é a palavra. A qualidade desse silêncio, dessa quietude, não é sentida pelo cérebro; está além dele. O cérebro pode conceber, formular ou fazer planos futuros, mas essa quietude o ultrapassa, além de toda imaginação ou desejo. Você fica tão quieto que seu corpo se torna parte integrante da terra e de tudo que faz parte dessa quietude.

E quando a brisa suave vinha das montanhas, agitando as folhas, essa quietude, essa qualidade extraordinária do silêncio, não era perturbada. A casa ficava entre as montanhas e o mar, a contemplá-lo.

E quando observava-o tão tranqüilo, você se tornava parte de tudo.

Era-se tudo, a luz e beleza do amor. Mais uma vez, dizer "você se tornava parte de tudo", não é correto: a palavra "você" não é adequada porque, na verdade, "você" não estava lá. "Você" não existia. Só havia aquela quietude, beleza e extraordinário sentido de amor.
* * *
As palavras "você" e "eu" separam as coisas. Mas nesse estranho silêncio e quietude, não existe essa divisão. E quando se olhava para fora, espaço e tempo pareciam ter chegado ao fim, e o espaço que divide não era real. Essa folha, aquele eucalipto e a água azul que brilha não eram diferentes de você.

A meditação é realmente muito simples. Nós a complicamos. Tecemos uma teia de idéias ao seu redor - o que é e o que não é. Mas ela não é nada disso. Por ser muito simples, escapa-nos; isso porque nossas mentes são muito complicadas, desgastadas pelo tempo e nele baseadas.

É essa mente que dita as atividades do coração e aí começa a confusão. Quando se anda sobre a areia ou se olha pela janela aqueles montes maravilhosos queimados pelo sol do último verão, a meditação vem naturalmente, com uma facilidade extraordinária. Por que somos seres humanos torturados, com lágrimas nos olhos e um riso falso nos lábios? Se puder caminhar só entre aqueles montes, nos bosques ou ao longo das areias brancas da praia, nessa solidão você saberá o que é meditação.

O êxtase da solidão vem quando já não se teme estar só - não mais fazendo parte do mundo, nem apegado a nada. Então, como a madrugada dessa manhã, vem silenciosamente e traça uma trilha dourada através da quietude, que lá estava no princípio, que lá está agora e que lá sempre estará.


* * *
Meditação é um movimento no e do desconhecido. Você não está lá, só o movimento. Ou é muito pequeno ou muito grande para esse movimento. Nada há atrás ou a frente dele. É aquela energia que o pensamento-matéria não pode tocar. O pensamento é perversão, pois trata-se do produto de ontem; é apanhado na labuta de séculos e, por isso mesmo, é confuso e nebuloso. Faça o que quiser, o conhecido não pode alcançar o desconhecido. Meditação é morrer para o conhecido.
* * *
A meditação de uma mente completamente silenciosa é a bênção que o homem está sempre procurando. Nesse silêncio, reside toda sua qualidade.
* * *
Uma vez lançada a base da virtude, que é ordem na relação, vem à existência essa qualidade do amor e do morrer, que pertence toda ela à vida; então a mente se torna extraordinariamente quieta, naturalmente silenciosa, não através da supressão, da disciplina e do controle, e este silêncio é imensamente rico.

Além disso, nenhuma palavra ou descrição é de qualquer valia. Então a mente já não investiga o absoluto, pois, naquele silêncio reside "o que é". E tudo isto é a bênção da meditação.


* * *
Depois das chuvas, as montanhas estavam esplêndidas, ainda queimadas do sol de verão; logo, todo o vale brotaria. Tinha chovido bem pesado e a beleza daquelas montanhas era indescritível. O céu ainda estava encoberto e no ar havia cheiro de sumagre, salva e eucalipto. Era esplêndido estar entre as árvores e uma estranha calma apossava-se de você. Diferente do mar à distância, essas montanhas estavam completamente quietas. Ao observar e olhar ao redor, você tinha deixado tudo lá embaixo naquela cabana - roupas, pensamentos e um estranho modo de vida. Aqui viajava-se com muita leveza, sem pensamentos, sem fardos e com um sentimento de total esvaziamento e beleza. Os pequenos arbustos verdes logo estariam mais verdes e, dentro de poucas semanas, teriam um cheiro mais forte. As codornas chamavam e umas poucas alçaram vôo. Sem o saber, a mente estava num estado de meditação em que o amor florescia. Afinal de contas, só no terreno da meditação pode brotar essa flor. Era realmente maravilhoso e, estranhamente, isso o acompanhava durante toda a noite; e, ao acordar, muito antes do nascer do sol, lá estava ainda em seu coração, com incrível alegria, sem qualquer razão aparente. Lá estava, inebriante e sem causa. E lá ficaria o dia todo, sem que você pedisse ou a convidasse para ficar.
* * *
Lá, na varanda perfumada, com a madrugada ainda distante e as árvores silenciosas, a essência era a beleza. Mas essa essência não é passível de experiência; a experiência tem de cessar, pois só faz reforçar o conhecido. O conhecido nunca é a essência.

A meditação nunca é a experiência esperada; é não só o fim da experiência, resposta ao desafio, grande ou pequeno, mas a abertura da porta de um forno, cujo fogo tudo destrói, sem deixar cinzas ou resíduos. Somos o que restou, sempre a dizer sim a milhares de ontens, uma série contínua de infindáveis memórias, escolha e desespero. O eu, grande ou pequeno, é o padrão da existência, com sofrimento sem fim.

Na chama da meditação, finda o pensamento; e, com ele, o sofrimento, pois nenhum dos dois é amor. Sem amor, não há essência; sem ele, só há cinzas em que baseamos a nossa existência. É do vazio que surge o amor.
* * *
Meditação é ação do silêncio.
* * *
Meditação não tem princípio nem fim; nela não há sucesso ou insucesso, acumulação ou renúncia; trata-se de um movimento sem finalidade e, portanto, além do tempo e espaço. Experienciá-la é negá-la, pois o experimentador está limitado pelo tempo e espaço, pela memória e o reconhecimento. O fundamento da verdadeira meditação é aquela atenção passiva que é completa libertação da autoridade e da ambição, da inveja e do medo. A meditação nada significa sem essa liberdade, sem o autoconhecimento; enquanto houver escolha, não haverá autoconhecimento. Escolha implica em conflito que impede a compreensão do que é. Divagar em alguma fantasia ou crença romântica não é meditação; o cérebro tem de livrar de todo o mito, ilusão e segurança, e encarar a sua falsidade. Sem distração, tudo se acha em movimento de meditação. A flor é a forma, o aroma, a cor e a beleza que é toda ela. Despedace-a, de fato ou verbalmente, e não haverá flor; só a lembrança do que foi, o que nunca é a flor. Meditação é a flor inteira em sua beleza, definhando e vivendo.
* * *
Meditação é estar livre de pensamento e um movimento no êxtase da verdade.
* * *
Estava muito quieto naquela manhã bem cedo e nem um pássaro ou folha agitava-se. A meditação, iniciada em profundezas incógnitas, prosseguia com intensidade e extensão crescentes, moldava o cérebro

em total silêncio, removendo a profundidade do pensamento, desenraizando sentimentos e esvaziando o cérebro do conhecido e sua sombra. Tratava-se de uma operação sem operador ou cirurgião; prosseguia como um cirurgião que operasse um câncer, extirpando todo o tecido contaminado, por temor de que pudesse se espalhar de novo.

Essa meditação prosseguiu por uma hora pelo relógio. E era meditação sem meditador. O meditador interfere com suas coisas estúpidas e vaidades, ambições e cobiça. O meditador é o pensamento, alimentado por esses conflitos e ofensas, e que deve cessar totalmente na meditação. Eis os fundamentos para a meditação.
* * *
Meditar é transcender o tempo. O tempo é a distância percorrida pelo pensamento em sua busca de realização. O percurso é sempre ao longo da velha senda, recoberta com novas vestimentas, vistas, etc., mas sempre a mesma estrada que leva a parte alguma - exceto à dor a ao sofrimento.

Só quando a mente transcende o tempo é que a verdade deixa de ser uma abstração. Então, a alegria já não é mais uma idéia derivada do prazer, mas realidade não-verbal.

O esvaziamento da mente do tempo é o silêncio de verdade e vê-lo é fazer, de modo a não haver divisão entre o ver e o fazer. No intervalo entre o ver e o fazer nasce o conflito, infelicidade e confusão. E o que não tem tempo é eterno.
* * *

A madrugada demorava a vir, as estrelas ainda brilhavam e as árvores estavam recolhidas; nenhum pássaro cantava, nem a corujinha que se agitou durante toda a noite, de árvore em árvore. Tudo estava quieto, exceto pelo bramido do mar. Havia um cheiro de muitas flores, folhas apodrecidas e chão úmido; o ar estava muito, muito calmo, e o cheiro por toda a parte. A terra esperava pela madrugada e o raiar do dia; havia expectativa, paciência e uma estranha quietude. A meditação prosseguiu com essa quietude, que era amor; não o amor de algo ou alguém, imagem, símbolo, palavra ou retrato. Era simplesmente amor, sem sentimento. Era algo completo em si, nu, intenso, sem raiz e direção. O som daquele pássaro ao longe era esse amor, que era direção e distância e que lá se achava fora do tempo e sem palavras.

Não se tratava de uma emoção que desvanece e é cruel; o símbolo, a palavra podem ser substituídos, mas a coisa não. Nua, era inteiramente vulnerável e, portanto, indestrutível. Tinha a inabalável resistência daquela "outra coisa", o incognoscível, que vinha através das árvores e d'além mar. Meditação era o som daquele pássaro, chamando do vazio, e o bramido do mar de encontro à praia. O amor só se dá no completo vazio. A madrugada acinzentada lá estava, longe do horizonte, e as árvores escuras estavam ainda mais intensamente escuras. Na meditação não há repetição, um hábito continuado; tudo que é conhecido morre e o desconhecido floresce. As estrelas tinham se desvanecido e as nuvens despertavam com a vinda do sol.
* * *
Meditação é um estado da mente que olha todas as coisas com total e completa atenção, e não parcialmente.
* * *
Meditação é a destruição da segurança e nisto existe grande beleza, não das coisas arranjadas pelo homem ou pela natureza, mas a que vem do silêncio. Este silêncio é o vazio de onde e para onde todas as coisas fluem e têm o seu ser. É incognoscível; o intelecto e o sentimento não podem abrir o caminho para ele; não há caminho para ele e qualquer método que a isso se proponha é invenção de um cérebro ambicioso. Todos os caminhos e meios do eu calculista devem ser totalmente destruídos; todo avanço ou retrocesso, a via do tempo, deve chegar a um fim, sem amanhãs. Meditação é destruição; é um perigo para aqueles que desejam levar uma vida superficial, fantasiosa e cheia de crendices.
* * *
A morte que a meditação produz é a imortalidade do novo.
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É a coisa mais maravilhosa, se você dela se aproxima. Poderia entrar nesse assunto, mas a descrição não é o descrito. Você deve aprender tudo isso observando-se - nenhum livro ou professor pode lhe ensinar.

Não dependa de quem quer que seja, não se filie a organizações espirituais; temos de aprender tudo por nós mesmos. E aí a mente descobrirá coisas inacreditáveis. Mas, para isso, não deve haver fragmentação e, isto sim, imensa estabilidade, rapidez e mobilidade.

Para tal mente não existe tempo e, por isso mesmo, a vida possui um significado bem diferente.
FIM

Estes escritos foram extraídos das seguintes fontes:


- Diário de Krishnamurti

- O Começo do Aprendizado

- O Despertar da Inteligência

- Além da Violência

- Você é o Mundo

- O Vôo da Águia

- A Questão do Impossível

- A Única Revolução

- Libertação do Conhecido

- Meditações 1969



- Palestras com Estudantes Americanos
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